DOS CONJUNTOS DE SOPRO AO CHORA BANANEIRA: OS CARNAVAIS DE CRUZ, UMA VIAGEM NOSTÁLGICA DE ALEGRIA
Dias desses, numa dessas conversas de fim de tarde com um amigo, fomos levados pelas memórias aos carnavais antigos de Cruz das Almas. Ele, como muitos outros cruzalmenses, lembrava com nitidez dos carnavais dos anos 70, 80 e 90, tempos do famoso Trio Carbasa que fazia a praça tremer ao som de cavaquinho, bateria e guitarra elétrica. Mas antes disso, décadas de 30, 40, 50, o que havia era um carnaval bem diferente, cheio de sopros e fantasias coloridas.
Naqueles dias de outrora, Cruz das Almas não era animada pelo som ensurdecedor dos trios elétricos. O que dominava as ruas eram os conjuntos de sopro, que enchiam de vida as mi-carêmes, eventos que mais tarde se transformariam nas conhecidas micaretas. Os desfiles das Cigarras, dos Ciganos e dos animados Corsos enchiam de cor e alegria as ruas, seguidos pela Marujada, os Caboclinhos, o Bumba-meu-boi, e a Escola de Samba de Leonel Bambá. Uma competição saudável, mas muito acirrada, entre as ruas da Vitória, das Poções e do Centro. E a Estrada de Ferro que só queria se divertir, sem competir com ninguém!
Os carros alegóricos, obras-primas de criatividade e talento, exibiam uma estética nova a cada ano, homenageando elementos da natureza e seres míticos como peixes voadores, fadas e cigarras gigantes. À noite, os salões das filarmônicas e o Cruz das Almas Clube se transformavam em palcos de elegância e folia, com bailes que continuavam até o amanhecer. Durante o dia, as crianças se divertiam nas batalhas de confete e serpentina, e nas matinês especialmente organizadas para elas.
Um ponto alto das festividades era a disputadíssima coroação da Rainha do Carnaval que acontecia no Salão Nobre da Prefeitura e seguia com uma alegre recepção de seus súditos no Cruz das Almas Clube. Este sim, um evento solene que contrastava com a alegria descompromissada das das crianças que corriam das caretas pelas ruas. O Jornal Nossa Terra, na década de 1950, já destacava a importância regional desses eventos: “O Cruz das Almas Clube – centro elegante do carnaval cruzalmense, dará três bailes sensacionais – domingo, segunda e terça. Segundo estamos informados, muita gente de Salvador e das cidades circunvizinhas virá divertir-se nos amplos salões do Cruz das Almas Clube”.
Os clubes e as filarmônicas eram o coração da festa. No Cruz das Almas Clube, no Paço Municipal e nas sedes da Euterpe Cruzalmense e da Lira Guarany, os bailes de fantasia reuniam desde a elite social até os operários da indústria do fumo, todos se unindo ao som das charangas e bandinhas que percorriam as ruas do Centro. Os blocos de “caretas” eram um espetáculo à parte, com suas máscaras assustadoras e trajes extravagantes, trazendo um toque de mistério e diversão.
Com o passar do tempo, a modernidade chegou, e lá nos anos 70 viram a ascensão do Trio Carbasa, que trouxe uma nova energia ao carnaval com seu som elétrico. Contudo, nos últimos anos, um grupo cultural valoroso tem trabalhado arduamente para resgatar as tradições antigas. Até as “caretas” voltaram a desfilar pelas ruas, encantando as festividades momescas de Cruz das Almas.
Mais recentemente, há cerca de uns quinze anos, o Bloco “Dos Que Não Foram”, puxado pelo mini-trio-elétrico “Chora Bananeira”, revive os carnavais de outrora nos domingos de Carnaval. A banda, composta por ex-músicos do Trio Elétrico Carbasa, toca desde antigas marchinhas carnavalescas como ‘Allah-la Ô’, ‘Ó Abre Alas’, ‘Mamãe Eu Quero’, ‘Cidade Maravilhosa’ até os sucessos de Armandinho, Luiz Caldas e Moraes Moreira, entre outros, trazendo nostalgia e alegria aos foliões.
Além disso, as ressacas de carnaval, bailes realizados após os dias oficiais de festa, têm ganhado popularidade, muitas vezes com um objetivo beneficente. Assim, as antigas tradições e o espírito comunitário continuam a viver no coração dos cruzalmenses, mantendo a chama do Carnaval acesa através das gerações.
E assim, em Cruz das Almas, o passado e o presente se encontram, criando uma celebração única que honra a história e as memórias de todos aqueles que, ao longo dos anos, contribuíram para fazer do Carnaval o que ele é hoje: uma verdadeira festa da vida. “Puxa o carro, Gilberto”!!!