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UM RESUMO DA HISTÓRIA DO SÃO JOÃO DE CRUZ DAS ALMAS

Uma Tradição Centenária e Vibrante

Se atualmente o São João de Cruz começa já na alvorada de 31 de maio para 1° de junho, antigamente o anoitecer do dia 24 de junho era que marcava o início das festas juninas em Cruz das Almas. As portas das casas eram abertas em um gesto acolhedor para quem passasse, fosse conhecido ou não. O aroma dos bolos recém-saídos do forno se misturava ao perfume dos licores de jenipapo e maracujá, além dos amendoins e laranjas dispostos nas mesas. Do lado de fora, visitantes batiam palmas e perguntavam: “São João passou por aí?” A resposta afirmativa do dono da casa era um convite para a entrada e para a celebração que tomava conta das residências num clima festivo e caloroso.

Tradição e Evolução

As festas juninas em Cruz das Almas são tão antigas quanto a própria cidade, com mais de 200 anos de história (126 só de emancipação política). Desde os primeiros tempos, as famílias colhiam lenha para acender fogueiras, convidando amigos para dançar ao som de forrós tocados com triângulos e zabumbas nas salas ou nos terreiros das casas. Nos anos 1950, o semanário Jornal Nossa Terra registrava as festividades juninas no Cruz das Almas Clube, destacando a importância do evento na vida social da cidade. Anos 60 e 70 chegam trazendo a Festa do Milho e a Festa da Laranja.

O Arraiá do Laranjá e a Guerra das Espadas

Em 1989, o prefeito Lourival Santos transformou a celebração junina em um evento de grande porte com a criação do Arraiá do Laranjá na Praça Sumaúma, atraindo turistas de Salvador e das redondezas. A “guerra de espadas”, um espetáculo de luzes e fogos, consolidou a fama da cidade como um dos destinos mais procurados para o São João. As espadas, liberando faíscas e chamas alaranjadas, tornaram-se um símbolo marcante da festa.

No entanto, a prática de soltar espadas foi proibida pela justiça em 2011 devido aos riscos que oferecia. Mesmo assim, alguns continuaram a manter a tradição, especialmente em ruas como a Rua da Estação, Estrada de Ferro, das Poções, Dois de Julho, Coplan e Itapicuru, desafiando a proibição, mas perpetuando a cultura local.

Transformações e Novos Eventos

A festa no Sumaúma, originalmente chamada de Arraiá do Laranjá, mudou de nome para “Forró Na Morá” em 1993. Um panfleto da época destacava cinco dias de festa com atrações como Genival Lacerda e a apresentação de quadrilhas juninas. A cidade já chegou a dedicar oficialmente dez dias de seu calendário às celebrações juninas, espalhando eventos por diferentes pontos.

Outro evento típico, muito aguardado e temido por alguns era o Casamento do Ceat. Originário de um projeto pedagógico dos alunos do Colégio Alberto Tôrres no final da década de 70, tratava-se da encenação cômica de um casamento na roça que, já lá pelos anos 80 e 90, o cortejo animado partia do portão do CEAT, seguia a Rua da Estação em direção ao Centro e terminava na Praça da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Bom Sucesso, com muita queima de espadas.

Nesse ínterim, décadas de 80 e 90 ainda, ocorrem também os famosos e muito aguardados forrós estilo “sala de reboco”, geralmente organizados por comissões de estudantes para angariar fundos para a formatura. Eram o Forró do Ceat, Forró de Agropecuária, Forró de Contabilidade, Forró de Agronomia, Forró do Cursinho Garagem, Forró do Karranca, Forró do CCA, Forró do CEC, Forró do Acadêmico, entre outros.

Em 1995, surgiu o Casamento do Seleão, uma outra festa que começou como uma brincadeira e cresceu, atraindo centenas de pessoas no Dia de São Pedro.

Modernização e Festas Privadas

No início dos anos 2000, a cidade passou a abrigar festas privadas, como o Forró do Bosque, criado pelos produtores Dólar e Paulo Tear. Realizada na Fazenda Cabana do Bosque, a festa tornou-se um grande sucesso. Outras festas fechadas, como a Cruz Light e o Forró Meu Xodó, também marcaram presença, embora sem o mesmo impacto.

Cultura e Celebração

Dos eventos de iniciativa popular, que quem viveu o São João de porta em porta das décadas de 80 e 90 tem uma belíssima lembrança, é a Mesa Junina de Maria Moura na Rua da Estação. Dona Maria Moura costumava confeccionar duas bandeiras, uma branca e uma vermelha. A branca sinalizava o momento em que ela ia ao centro da rua e arrumava uma mesa cheia de comidas e bebidas típicas no dia de São João. No momento em que a bandeira branca estivesse no alto ninguém poderia queimar espadas, enquanto a mesa estava à disposição de todos que quisessem apreciar as guloseimas. O contrário acontecia quando a bandeira vermelha era levantada e significava que o fogo das espadas estava liberado. Atualmente, D. Maria Moura reside na Rua da Malva.

Um outro evento, criado há 20 anos e que já virou tradição é a Festa da Alvorada (também conhecida como Aguardando o São João) na Estrada de Ferro, oficialmente Rua Rio Branco. Esta festa surgiu da ideia de alguns amigos moradores da Estrada de Ferro que resolveram saudar a chegada do mês de junho, o mês das festas juninas, com uma alvorada de espadas, na virada do dia 31 para o dia 1°. Deu certo!!!

A partir de 2005, Cruz das Almas passou a celebrar o São João com o tema “Arraiá da Cultura Popular”, reunindo festividades em diversas praças e criando o cortejo “Arrasta-pé Cultural” que tomava as ruas centrais da cidade no dia 1° de junho. Já a partir de 2022, o “Arraiá” mudou de endereço, inaugurando o Circuito Luiz Gonzaga, um espaço fechado (porém de livre acesso público) com mais de 20.000m², localizado na Avenida Getúlio Vargas, na área da antiga estação do ramal ferroviário, próximo à entrada da cidade. Uma estrutura moderna e mais adequada para atender ao grande fluxo de moradores e turistas que lotam a festa para assistir as grandes atrações musicais.

Assim, a tradição junina da cidade, com sua rica história e vibrantes celebrações, continua a encantar moradores e turistas, mantendo viva uma das mais autênticas expressões culturais do Recôncavo Baiano.

Edisandro Barbosa Bingre

Edisandro Barbosa Bingre é professor, escritor, cerimonialista e pesquisador memorialista de Cruz das Almas. Ele é membro da Academia Cruzalmense de Letras e destaca-se por seu trabalho com o "Almanaque Cruzalmense", onde documenta e preserva a história e a memória cultural da cidade. Bingre é reconhecido por suas contribuições literárias e históricas, trazendo à tona fatos importantes e curiosidades sobre a região, além de ser uma figura ativa na comunidade intelectual de Cruz das Almas​. No ano de 2020 recebeu o Título de Cidadão Cruzalmense outorgado pela Câmara de Vereadores de Cruz das Almas.

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