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UM QUADRO PARA A LENDA DA COVA DO NEGO

Imaginemos a cena: uma mulher negra, vestida com roupas simples de escrava, ajoelhada ao lado de uma humilde palhoça na roça de fumo. Seu rosto está marcado pela dor e pela tristeza, lágrimas escorrem por sua face enquanto ela olha para o chão onde cavou uma pequena cova para seu filho. Ao lado da mulher, o corpo do menino está envolto em um lençol simples, pronto para ser colocado na cova.

Ao fundo e ao longe, vemos os campos verdejantes, estendendo-se até o horizonte, envoltos pela luz suave da lua cheia. No céu noturno, as estrelas brilham como testemunhas silenciosas da tragédia que se desenrola na terra.

A cena transmite uma sensação de tristeza e injustiça, destacando a luta da mulher negra contra as crueldades da escravidão e a negação de dignidade para seu filho mesmo após a morte.

E você conhece a lenda cruzalmense da “Cova do Nego”?

Dizem que a Cova do Nego é uma localidade antiga, aqui de Cruz das Almas, que passou assim a chamar-se pois, em tempos idos, uma mãe, negra, provavelmente escravizada ou descendente de africanos escravizados, que não teve por parte de seu senhor, permissão para enterrar o filho morto no único cemitério da cidade e acabou tendo que enterrá-lo por ali mesmo, numa cova próxima da sua casa.

Quem passava pela estrada ali próxima, avistava aquela pequena cruz de madeira sobre um montinho na roça de fumo e ficava curioso em saber do que se tratava. Respondiam que era a “cova do nego”.

Importante lembrar de uma questão histórico-cultural: naquela época, não existiam cemitérios públicos e, por isso, nem todos tinham “direito” a um funeral cristão ou dispunham de condições financeiras para fazê-lo.

(Imagem: UNE PIETÀ SUD-AFRICAINE, serigrafia de Ernest Pignon-Ernest, 2002, Durban & Soweto)

Edisandro Barbosa Bingre

Edisandro Barbosa Bingre é professor, escritor, cerimonialista e pesquisador memorialista de Cruz das Almas. Ele é membro da Academia Cruzalmense de Letras e destaca-se por seu trabalho com o "Almanaque Cruzalmense", onde documenta e preserva a história e a memória cultural da cidade. Bingre é reconhecido por suas contribuições literárias e históricas, trazendo à tona fatos importantes e curiosidades sobre a região, além de ser uma figura ativa na comunidade intelectual de Cruz das Almas​. No ano de 2020 recebeu o Título de Cidadão Cruzalmense outorgado pela Câmara de Vereadores de Cruz das Almas.

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